Cigana Sarita

 




Cigana Sarita 

   A noite estava muito escura. Lara caminhava com dificuldade pisando sobre pedras que não conseguia enxergar.     Andando há mais de uma hora, vira a lua aparecer no céu, mas as nuvens que insistiam em cobri-la não deixavam que o percurso fosse iluminado e seu destino dava a impressão de estar cada vez mais distante. Por sorte conhecia de cor os atalhos que tomara e tinha a esperança de chegar antes que alguém desconfiasse que fora até a cidade.     Dissera à velha Mina que iria tomar banho em uma cachoeira pouco distante do acampamento, mas que voltaria antes do cair da noite.     Desconfiada, a velha ama insistiu em fazer-lhe companhia, mas foi rechaçada de forma grosseira, coisa pouco usual na convivência entre elas.     No acampamento, Mina fechou-se na tenda que dividia com Lara em profundo silêncio para que pensassem que ambas não estavam. Porém, conforme as horas se passavam seu coração apertava de medo pelo que poderia acontecer à querida sobrinha caso descobrissem o que ela fora fazer.     Lara não dissera uma palavra sequer, mas ela sabia, criara a garota desde a mais tenra infância e conhecia seus pensamentos e hábitos mais que ela própria. Percebera imediatamente os olhares trocados entre a jovem e o belo cavalheiro que encontraram em uma de suas idas à cidade. A beleza da cigana enfeitiçara o rapaz e Mina, experiente nesses assuntos, vira claramente o fogo da paixão imediatamente correspondida. Tentara por diversas vezes alertar a sobrinha fazendo-a lembrar-se de seu compromisso com o cigano Juan, filho do chefe, mas ela não lhe dera ouvidos e sempre gritava que não havia nada e que a velhice da mulher é que inventava esses romances absurdos.     Contudo ela sabia que os encontros às escondidas estavam ficando cada vez mais frequentes e se algo não fosse feito Lara seria descoberta e acabaria, com certeza, expulsa ou morta, já que isso jamais seria perdoado pelo conselho dos anciãos.     Teve um estremecimento ao ouvir a voz de Juan chamando por Lara.     O que fazer? Ficar quieta e não revelar que ali estava? Ou sair e contar a história da cachoeira? Resolveu sair. - Lara foi tomar banho lá na cascata azul, filho! - Exclamou ela. O rapaz olhou-a com ódio e gritou extremamente transtornado: - Como ousa mentir para mim velha Mina? Fui informado que sua sobrinha foi para a cidade deitar-se com um Gadjo, só vim até aqui para ter certeza de não encontrá-la, mas vou atrás dela nesse instante e não me chamarei Juan se a deixar viva. Minha honra foi maculada e não posso deixar que essa desavergonhada, que foi prometida a mim, fique viva para arrastar meu nome na lama!     Ao ouvir essa ameaça a mulher esqueceu-se de suas dores e correu em direção à saída do acampamento, tinha de achar Lara antes dele.     Era tarde. A cigana calmamente caminhava em sua direção. Mina gritou com voz rouca como que arrancada do fundo do peito: - Corra minha filha!     Lara avistou seu prometido logo atrás da tia e num segundo entendeu tudo, virou-se e passou a correr por onde viera.     O Cigano Juan, por ser muito respeitado no clã, estava com a companhia de mais 3 ciganos, que estavam dispostos a se vingarem da Cigana Lara, e manter a honra de todos os homens do acampamento.     Com a vingança estampada nos olhos, o grupo de ciganos encurralaram a desprotegida Lara, deixando-a frente a frente com o Cigano sedento de vingança e com o coração cheio de ódio.     Juan sem misericórdia, empunhou seu punhal de lâmina de aço e cabo feito de ouro e lançou em direção de Lara.     O punhal certeiro do cigano atingiu-lhe em cheio o centro do coração, fazendo-a tombar de dor. A velha Mina ajoelhou-se em desespero gritando sobre a bela cigana, mas não havia mais nada a fazer. O espírito de Lara desprendeu-se e entregou-se à natureza.     A passagem de Lara pelos campos escuros das provações foi breve, após muitos ensinamentos e preparos para a evolução necessária, tornou-se a Cigana Sarita e hoje alegra muitos terreiros com sua juventude e graça.     Apesar de adorar a dança sempre atende aos que a procuram com carinho e grande senso de justiça, agradece a oportunidade de poder ajudar e sai dançando com um largo sorriso! Saravá a Cigana Sarita!

 

 

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